Sócia e diretora da Agência MOV, de Ribeirão Preto, Aline Pileggi comenta premiação de um dos festivais de publicidade mais importantes do mundo: o Festival de Cannes

Um dos mais importantes festivais de publicidade do mundo, o Festival de Cannes, realizado na França, mostra que o consumo tem se tornado um ato político. Nos últimos três anos, o festival tem mudado o tom das campanhas inscritas e seus premiados: temas sociais, igualdade de gênero e inclusão ganham cada vez mais destaque.

A sócia e diretora de Criação da Agência MOV, Aline Pileggi, debateu o tema no Papo com Leão, promovido pela Associação dos Profissionais de Propaganda (APP) Ribeirão Preto. Segundo ela, com esse novo olhar ganham as empresas que ampliam a lente da publicidade e conectam marcas e pessoas por propósito e engajamento.

Na entrevista a seguir, Aline destaca campanhas que considera inovadoras e a mudança de percepção na publicidade. “Posicionamento requer coragem, resistência e uma mudança cultural. Tudo isso leva tempo”, afirma. 

O que mudou no Festival de Cannes desde a premiação que você conquistou, em 2007, até hoje? 
Fui premiada com uma ação de Marketing Direto para a Harley Davidson. Quando ganhei o Leão, estávamos discutindo a Big Ideia — hoje estamos falando sobre como ideias podem mudar o mundo. Minha história no mercado de trabalho e a de muitas mulheres é discutida hoje nos festivais com a temática da igualdade de gênero. Quando fui premiada, foi uma quebra de paradigma: duas meninas, que não ganhavam nem metade do que os homens da agência, criaram uma campanha para uma moto e ganharam o primeiro Leão da Grey Brasil. Em um universo tomado por homens, isso foi marcante. Com certeza, o caminho é muito mais difícil para as mulheres e essa desigualdade vem sendo discutida de forma mais intensa nos últimos três anos do Festival.

Em sua opinião, qual o caminho que o Festival e a publicidade estão tomando?
Mais da metade dos premiados de Cannes 2019 abordaram temas políticos, sociais, inclusão e igualdade de gênero. Cases tão incríveis que nos levam a refletir se o consumo esta se tornando um ato político. Nesse novo olhar, ganham as marcas que ampliam a lente da publicidade e conectam marcas e pessoas por propósito e engajamento. Ganham as marcas que conseguem unir criatividade e tecnologia para desenvolver algo realmente relevante para a vida das pessoas.

Nessa linha, quais os premiados em Cannes que você destacaria?  
“The E.V.A. para Volvo”. Essa campanha foi criada com base em uma pesquisa da Volvo que mostra que as mulheres sofrem mais danos em acidentes de carro que os homens. E sabe por quê? Porque os testes de segurança são feitos por homens! A proposta é que a partir dos dados da pesquisa, toda a indústria automobilística se mobilize para fazer as mudanças necessárias para deixar os carros mais seguros, também, para as mulheres. Essa é, inclusive, uma forma completamente diferente de se posicionar. Onde esta a propaganda aí? Na causa. Outro destaque seria a campanha “The Tampon Book”, um case que vem da Alemanha. Para driblar a alta taxa de impostos dos absorventes (taxados como artigos de luxo), a The Female Company transformou as embalagens em livros (7% de imposto). Um benefício real para a consumidora e uma enorme exposição de mídia. Há também o case “A IKEA”, que levou o GrandPrix com uma ação que ofereceu ao consumidor a possibilidade de imprimir peças em 3D para transformar os móveis em produtos adaptáveis. O “Tapete da acessibilidade”, criado pela Ford, foi, também, uma ideia simples que ajuda a dar mais independência aos cadeirantes e amplia a mobilidade fora do carro, com segurança. Como podemos notar, todos os cases citados vão muito além da publicidade tradicional: são ideias que, aliadas à tecnologia, têm o poder de fazer a diferença na vida das pessoas.

Você acha que as empresas e o público do interior estão preparados para essas mudanças?
Acho que o público quer e espera isso das marcas. Não dá para ficar em cima do muro. As pessoas precisam se identificar com a sua marca, com o seu propósito. Isso, no entanto, é um processo e essa mudança tem de ocorrer de dentro da fora. Não adianta se posicionar como empresa que abraça causas sociais, que trabalha a inclusão, sustentabilidade e igualdade de gênero, mas nada disso ser aplicado no dia a dia. Posicionamento requer coragem, resistência e uma mudança cultural. Tudo isso leva tempo.

  A Agência MOV tem acompanhado essa tendência?
Acabamos de criar uma campanha sobre vagas preferenciais e é chocante o número de multas aplicadas por essas infrações. Com a campanha, convidamos as pessoas a se colocarem no lugar do outro e, pela empatia, tentamos sensibilizar quem comete essas infrações. É um desafio, um trabalho de formiguinha e uma mudança cultural que leva tempo, mas, com criatividade, podemos contribuir muito. 

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